Por Bruno Marcelos
A discussão judicial sobre o fornecimento de remédios é tema sempre recorrente em demandas judiciais relacionadas a saúde. A questão é complexa e registra a já evidenciada falta de integração entre os sistemas de saúde, com a exposição de suas limitações, e cercada por decisões judiciais que desconsideram a responsabilidade constitucional.
Para não perdermos o foco do recorte relacionado a questão dos remédios, registramos que nossa opinião sobre a integração dos sistemas de saúde está no artigo O julgamento sobre a extensão do rol resolverá o problema da saúde suplementar? Momento em que registramos a falta de uma política pública nacional para a saúde.
Essa ausência de integração nos trás para o tema em debate: remédios.
Na saúde suplementar, identificamos a obrigação de cobertura para remédios em apenas duas circunstâncias bem definidas, ambas previstas na Lei 9.656/98: no Art. 12, II, d (uso de medicação hospitalar), e ainda, Art. 12, II, g (antineoplásicos orais de uso domiciliar inscritos no rol).
A mesma lei que regula o setor, possui apenas quatro segmentações independentes e que podem ser somadas: ambulatorial, hospitalar, obstétrica e odontológica, inexistindo na lei a previsão de cobertura farmacológica (existe projeto de lei neste sentido, mas o PLS não avançou).
A cobertura farmacológica, portanto, pertence ao obrigado constitucional originário, o SUS, que deve recepcionar o pedido médico e proceder com o devido fornecimento da medicação de alto custo necessária ao tratamento do paciente.
Do ponto de vista legal, parece bem esclarecida a questão, na prática, não é isto o que acontece.
As Operadoras são exigidas para a cobertura de medicamentos diversos, na sua maioria, de elevado custo e que não possuem cobertura pelo rol e pela lei. Este fenômeno de inclusão judicial da cobertura na segmentação farmacológica importa na flagrante violação ao mutualismo contratual, na medida em que o paciente que se beneficia da tutela de urgência, prejudica os demais beneficiários do contrato coletivo.
Neste contexto, há clara violação de direitos coletivos dos demais beneficiários (consumidores) que não anuíram com a cobertura não prevista em lei.
Note que, ainda que o rol seja considerado exemplificativo, a LEI não prevê esta modalidade de cobertura (farmacológica), devendo atrair a responsabilidade Constitucional do SUS para o atendimento do paciente.
Fato este que deve ser considerado pelo julgador quando do recebimento de demandas desta natureza, para que, ao menos determine a intimação das secretarias de saúde para informar o meio de fornecimento da medicação excepcional junto ao SUS, assegurando com isto, a regularidade das disposições legais.
Necessário registrar que a determinação para que o SUS assegure a cobertura não prevista contratualmente está no cotidiano do judiciário, veja-se, por exemplo, beneficiários que ingressam pela emergência com contrato apenas com cobertura apenas ambulatorial, onde o SUS é chamado a transferir o paciente para hospital da rede pública.
Fica patente que o judiciário já reconhece a existência/necessidade de integração entre os sistemas de saúde, e principalmente, sabe como proceder. No entanto, esta mesma integração deve ser efetivamente estendida a todos os demais casos equivalentes, assegurando o direito constitucional a vida (saúde como elemento intrínseco), os direitos coletivos dos demais consumidores ligados ao contrato (mutualismo) e a preservação da ordem legal trazendo consigo segurança jurídica e previsibilidade aos contratos.