Os reflexos jurídicos da Lei que a altera o marco regulatório na saude suplementar

Foi promulgada na última sexta, 3/3/2022, a Lei 14.307/22 que alterou o marco regulatório da Saúde Suplementar, a Lei 9.656/98. A alteração legislativa representa o movimento dos Poderes Legislativo e Executivo em fixar a taxatividade do rol de procedimentos e eventos em saúde da ANS.

Em acordo com o previsto na lei, que em muito se aproxima dos prazos da RN ANS 470/21, a ANS passa a ter o prazo de 180 dias, prorrogáveis excepcionalmente por 90 dias, para concluir o processo de atualização do rol, exceto, os medicamentos antineoplásicos que devem ter o processo concluído em 120 dias, prorrogáveis por 60 dias,

Interessante notar que a Lei fala em inclusão compulsória da tecnologia e/ou medicamento, caso atingido o prazo, com a possibilidade de reversão com a eventual negativa de incorporação posterior. A questão é relevante porque cria uma “consequência” pela perda no prazo para atualizar o rol. De outro lado, o indeferimento posterior de inclusão poderá gerar prejuízos não previstos pela Lei e que demandarão a devida atuação da ANS no sentido de ajustar seus efeitos.

Incluem-se no rol também as tecnologias aprovadas pelo CONITEC para incorporação no SUS, estas que devem ser inseridas no rol no prazo de 60 dias. Aqui temos um problema relevante: nem tudo o que está aprovado para o SUS possui cobertura para a Saúde Suplementar.

E isto porque, órteses, próteses e determinados medicamentos são aprovados pelo CONITEC para uso pelo SUS, no entanto, não possuem cobertura pela Saúde Suplementar por exclusão expressa da Lei 9.656/98.

A singela referência a sua inclusão, sem a devida ressalva quanto a sua limitação, certamente será causa problemas relacionados a maior judicialização, podendo levar o consumidor a compreender que houve a equiparação entre o SUS e o sistema privado de saúde. Neste contexto, podemos utilizar como exemplo o sistema de bomba de insulina, que não possui previsão no rol por se tratar de uma órtese, mas, possui previsão no CONITEC para incorporação como tecnologia do SUS desde 2018.

Aqui ainda há um fato relevante, o CONITEC possui condições para fornecimento de determinadas tecnologias, fixados por meio de seus protocolos, o que na saúde suplementar seria equivalente da Diretriz de Utilização. Teremos o uso deste mesmo critério para os planos privados? Nos parece que sim, na medida em que a lei não cria ressalvas, determinando que a inclusão se dê nos mesmos termos do CONITEC.

Além desta questão verificamos uma modulação do prazo da RN ANS 259/11 para o fornecimento de antineoplásicos orais de uso ambulatorial, fixando a lei o prazo de 10 dias contados do protocolo do pedido médico, tratando-se de outra medida que demandará o exercício regulatório, porquanto há divergência não apenas no prazo, mas na forma de dispensação.

E isto porque, parte dos pacientes é atendida na rede credenciada da Operadora, que eventualmente não atenderá o prazo previsto na lei (veja-se a eventual necessidade de importação da medicação, problemas de logística, etc), neste contexto, caberia a Operadora apenas autorizar a cobertura para a medicação, no entanto como o visto na letra da lei, não há menção a esta hipótese.

Por fim, necessário registrar que a 2ª seção do STJ ainda não finalizou o julgamento relativo a taxatividade do rol, fato este que poderá causar a morte de toda a letra da lei, na medida em que o rol exemplificativo tornaria a própria existência do rol desnecessária. De outro lado, a teoria do rol taxativo mitigado, igualmente perde sua força, porquanto há um processo legal de atualização do rol, com prazos e formas que compelem a Agência a assegurar a atualidade do rol.

A nova lei trará novos debates, com a necessária atualização pela ANS da RN 470/21, e demais atos regulatórios necessários a adequação a nova lei. Sendo certo que sem o julgamento definitivo da extensão do rol no STJ, claramente nada estará definido.

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