Mudanças e implicações jurídicas na publicidade médica propostas pela nova resolução do CFM Nº 2.336/2023

por Gabriela Caminha e Débora Wyatt

Na última segunda-feira, 11 de março de 2024, entrou em vigor a Resolução CFM Nº 2.336/2023 que versa sobre as (novas) regras de publicidade e propaganda médicas, após quatro anos da abertura da consulta pública para atualização da polêmica resolução Nº 1.974/11 que regulava o marketing médico.

Em 2020, o Conselho Federal de Medicina (CFM) abriu, durante o mês de fevereiro, posteriormente prorrogado até 20 de março daquele ano, um processo de consulta pública para que os profissionais médicos, devidamente registrados em seus Conselhos Regionais (CRM) pudessem enviar sugestões de atualização da polêmica Resolução nº 1.974/2011, que versava sobre a Publicidade Médica, mas vinha sendo muito criticada por não acompanhar a realidade mundial na era digital.

Nota-se que isto já era um problema latente antes mesmo da pandemia ocorrer e acelerar ainda mais o processo de transformação digital tornando ainda mais imprescindível a modernização diante do ocorrido, vez que a classe médica vinha se sentindo muito prejudicada com as restrições impostas pelo Conselho, principalmente diante de uma maior flexibilidade por parte de outros conselhos de saúde que regulam profissionais que, de certa forma, concorrem com os médicos em algumas atividades.

O CFM sempre teve a preocupação de que a participação dos médicos na divulgação de assuntos médicos, em qualquer meio de comunicação se pautassem pelo caráter exclusivo de esclarecimento e educação da sociedade, não estimulando o sensacionalismo, a autopromoção ou a mercantilização do ato médico, buscando assegurar apenas a divulgação de conteúdo cientificamente comprovado, válido, pertinente e de interesse público e evitar distorções ou conflitos de interesse que pudessem comprometer o  comprometer o entendimento das colocações acarretando consequências para a saúde individual ou coletiva.

No entanto diante da transformação digital foi extremamente necessário adaptar as regras de divulgação publicitária sem negligenciar os princípios basilares da medicina, procurando equilibrar a promoção ética da prática médica com a proteção do público e a preservação da confiança na profissão médica. Neste cenário se destacam como principais pontos:

1. Inclusão e detalhamento sobre redes sociais: A nova resolução dedica um capítulo específico à publicidade e propaganda nas redes sociais próprias de médicos e estabelecimentos médicos, mostrando uma adaptação às novas formas de comunicação. A resolução anterior não tratava especificamente das redes sociais, falava apenas em “sites para assuntos médicos”.

2. Especificação detalhada de permissões: A nova resolução fornece uma lista detalhada do que é permitido na publicidade médica, como a utilização de fotos do ambiente de trabalho, anúncios de tecnologias e serviços agregados, e orientações sobre marcação de consultas. Isso contrasta com a abordagem mais geral da resolução anterior, que focava mais nas restrições do que nas possibilidades.

3. Orientações para o uso de imagens de pacientes: A Resolução de 2011 proibia expressamente a exposição da figura do paciente como forma de divulgar técnica, método ou resultado de tratamento, ainda que sem identificá-lo e autorizado por ele, já a Resolução de 2023 passou a permitir Passou-se a permitir a divulgação de imagens de antes e depois, sem qualquer tipo de manipulação ou identificação do paciente desde que relacionado à especialidade do médico e acompanhada de texto educativo sobre suas indicações terapêuticas, contraindicações e possíveis intercorrências e sempre que possível demonstrando a perspectiva de tratamento para diferentes biotipos e faixas etárias, bem como a evolução do paciente.

4. Restrições ampliadas e detalhadas: Ambas as resoluções impõem restrições à publicidade e propaganda médica para proteger a ética profissional e os pacientes, mas a nova resolução detalha essas restrições, flexibilizando de forma orientada diversas questões, refletindo uma abordagem mais cautelosa e contemporânea.

5. Identificação obrigatória: Ambas as resoluções determinavam a necessidade de se incluir, em todas as peças publicitárias, os dados de identificação do médico, como nome, número de registro no Conselho Regional de Medicina (CRM), e, quando aplicável, a especialidade e o número de Registro de Qualificação de Especialista (RQE) e, no caso de pessoas jurídicas, tais informações do diretor técnico-médico, bem como o nome do estabelecimento com número de cadastro ou registro no CRM.

6. Distinção entre conteúdo pessoal e profissional: A nova resolução ao permitir o uso das redes sociais para publicidade médica, incluindo os conteúdos temporários (como stories no Instagram), determina a aplicação ao conteúdo das mesmas regras impostas às demais publicidades, estabelecendo ainda que quando o médico utilizar suas redes sociais para postar tanto conteúdos relacionados à medicina quanto à sua vida privada, deve claramente distinguir entre os dois, assegurando que as postagens profissionais estejam em conformidade com as normas da resolução.

7. Autorretratos e testemunhos: A nova resolução permite a publicação de autorretratos (selfies), imagens e áudios desde que não tenham características de sensacionalismo ou concorrência desleal. Além disso, publicações e repostagens de terceiros ou pacientes que elogiem a técnica e o resultado de procedimentos médicos devem ser tratadas com cautela e permanecem sujeitas a investigação se ocorrerem de modo reiterado e/ou sistemático e ao serem repostadas pelo médico em suas próprias redes sociais passam a ser consideradas como publicações e atender às regras previstas.

8. Informações sobre Agendamento e Atendimento: A Resolução de 2023 autoriza que os médicos incluam em suas publicidades informações sobre como marcar consultas, horários de atendimento e dinâmica de funcionamento do estabelecimento, podendo divulgar valores de consultas e procedimentos, as formas e condições de pagamento aceitas, bem como descontos e promoções, desde que não estejam vinculados a vendas casadas ou a premiações que possam induzir a interpretações enganosas.

9. Divulgação do ambiente de trabalho: AResolução de 2023 autorizou a divulgação da estrutura de trabalho do médico, regulamentando a possibilidade de apresentar seu local de trabalho, equipamentos e recursos tecnológicos aprovados pela ANVISA e equipe (inclusive de profissionais de área correlata à medicina), desde que não insinuem capacidade privilegiada ou outras menções que possam ferir sua ética profissional, tais como comparação com outras instituições, colegas, especialidades ou técnicas e procedimentos.

10. Divulgação de pós-graduação: Na vigência da Resolução de 2011 era expressamente proibido a divulgação de qualquer informação que pudesse levar ao paciente a entender que o médico sem residência e registro de especialidade (RQE) no Conselho de sua região era especialista, mas com a nova resolução, passou a se admitir que o médico com pós-graduação passe a anunciar seus títulos acadêmicos, desde que seguido de “NÃO ESPECIALISTA”.

É incontroverso que a entrada em vigor da Resolução CFM Nº 2.336/2023 marca um avanço significativo na adequação das normas de publicidade e propaganda médica à era digital, refletindo a necessidade de modernização diante dos avanços tecnológicos e da transformação digital. No entanto, compartilhando o entendimento do CRM, a caminhada é longa e é oportuno que a relação entre o mercado e o médico seja honesta, podendo existir uma publicidade voltada para a educação da sociedade e outra para a formação, manutenção ou ampliação da clientela.

Nesse sentido, o equilíbrio proposto pela Resolução busca a promoção ética da medicina com a proteção ao consumidor/ paciente, ampliando as possibilidades de comunicação dos médicos, sem negligenciar os princípios éticos fundamentais da profissão, assegurando a divulgação responsável e informativa sobre a saúde, o que demonstra um compromisso com a educação e o esclarecimento da sociedade, mantendo a confiança na profissão médica.

Bibliografia:

https://portal.cfm.org.br/publicidademedica/pubpropaganda4.html

Manual de Publicidade Médica (2011) – https://portal.cfm.org.br/publicidademedica/arquivos/cfm1974_11.pdf

RESOLUÇÃO CFM Nº 2.336/2023 – https://sistemas.cfm.org.br/normas/visualizar/resolucoes/BR/2023/2336

Manual de Publicidade Médica (2023) https://crmma.org.br/wp-content/uploads/2024/03/Manual-de-publicidade-completo-1.pdf Publicidade médica – apresentação coletiva 12/09 – https://sbdfl.org.br/wp-content/uploads/2023/09/Publicidade-me%CC%81dica-apresentac%CC%A7a%CC%83o-coletiva-12_09-1.pdf

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