Por Maria Luísa Matos
O Processo Ético-Profissional é um procedimento administrativo instaurado contra um profissional acusado de cometer uma infração ética. Este julgamento é realizado por outros médicos, diferenciando-se de um julgamento judicial. Os fatos são analisados de acordo com os princípios e valores que orientam a profissão médica, levando em consideração o conhecimento técnico-científico mínimo exigido de cada médico, as dificuldades estruturais em que ocorreram os atendimentos questionados, a complexidade do caso e a imprevisibilidade das possíveis complicações (BEHRENS, Paulo Eduardo).
Os Conselhos Regionais de Medicina têm autoridade para julgar infrações éticas, conforme o artigo 2º da Lei 3.268/57. Esta lei estabelece que o Conselho Federal e os Conselhos Regionais de Medicina são os órgãos supervisores da ética profissional em todo o país, atuando simultaneamente como juízes e disciplinadores da classe médica. Eles têm a responsabilidade de zelar e trabalhar para garantir a prática ética da medicina e manter a reputação e o bom conceito da profissão e dos profissionais que a exercem legalmente.
Portanto, podemos destacar que os conselhos de medicina têm a competência de: a) controlar e regulamentar a prática ética da profissão; b) fiscalizar e estabelecer regras para a prática ética da profissão; c) exercer poder judicante; d) exercer poder de polícia para processar e punir os infratores.
A natureza jurídica dos Conselhos de Medicina, conforme a ADI 1717, é de direito público, pois foram criados por lei. Cada um deles tem personalidade jurídica própria, com autonomia administrativa e financeira, e exerce a atividade de fiscalização do exercício profissional, que é uma atividade tipicamente pública, conforme os artigos 5º, XIII, 21, XXIV e 22, XVI da Constituição Federal. Portanto, cada um deles é uma autarquia, embora a lei que os criou declare que todos, em conjunto, constituem uma autarquia.
A capacidade para ser parte denunciada nos processos éticos é de médico regularmente inscrito nos Conselhos Regionais e, conforme o artigo 28 do Decreto 20.931/32, o diretor técnico de estabelecimento de saúde. Destaca-se que nenhum estabelecimento de hospitalização ou de assistência médica, público ou privado, pode funcionar em qualquer parte do território nacional sem ter um diretor técnico e principal responsável, habilitado para o exercício da medicina nos termos do regulamento sanitário federal. Por fim, o preâmbulo do Código de Ética Médica estabelece que as organizações de prestação de serviços médicos estão sujeitas às normas deste código.
Ao proceder com a análise dos dados, conforme ilustrado no infográfico, observa-se um incremento expressivo. O acréscimo de 302% no número de processos e o aumento de 180% nas condenações pelo Conselho Federal de Medicina (CFM) na última década sinalizam uma intensificação na fiscalização e aplicação das normas éticas na profissão médica. Tal fenômeno pode ser interpretado como um esforço para assegurar a qualidade do atendimento médico e a aderência aos padrões éticos. Contudo, também pode refletir um crescimento nas denúncias, o que pode ser motivado por uma variedade de fatores, incluindo maior conscientização sobre os direitos dos pacientes e a ética médica. É imperativo recordar que cada caso é único e deve ser analisado individualmente. As estatísticas podem nos fornecer uma visão geral, mas não nos proporcionam o contexto completo de cada situação individual. É de suma importância que os profissionais da área médica estejam sempre atualizados e em conformidade com as normas éticas para garantir a melhor prática possível.
É necessária a presença de advogado?
A questão da presença de um advogado para a parte denunciada é bastante controversa. Por um lado, temos a Súmula Vinculante nº 5 do STF, que estabelece que a ausência de defesa técnica por advogado no processo administrativo disciplinar não viola a Constituição. Por outro lado, temos o Rcl nº 9.340 Agr do Relator Ministro Ricardo Lewandowski, que afirma que a jurisprudência desta Corte é firme no sentido de que a Súmula Vinculante 5 não se aplica a procedimentos administrativos para apuração de falta grave em estabelecimentos prisionais.
Corroborando com o último entendimento, BEHERENS argumenta que, como não há obrigatoriedade em aplicar as penas previstas em lei de forma gradativa num processo ético-profissional (o que é apenas desejável), não é possível saber, de antemão, se a instrução do PEP demonstrará a existência de uma falta grave ou não. Portanto, potencialmente todas as faltas éticas sugeridas podem ser graves e, neste sentido, de acordo com o que vimos do voto do Ministro Lewandowski, torna-se imprescindível a presença de um advogado no processo. (BEHERENS, Paulo Eduardo. Código de Processo Ético-Profissional Médico Comentado, p. 158).
Conforme a análise jurídica do infográfico, constatamos que, no decorrer do ano de 2023, os dados apresentados foram os seguintes:
De acordo com o artigo 22 da Lei nº 3.268/57, as penalidades disciplinares que os Conselhos Regionais podem aplicar aos seus membros incluem: advertência confidencial em aviso reservado, censura confidencial em aviso reservado, censura pública em publicação oficial, suspensão do exercício profissional até 30 dias, e cassação do exercício profissional, ad referendum do Conselho Federal. A aplicação dessas penas deve seguir uma gradação, exceto em casos de gravidade manifesta que exigem a aplicação imediata de uma penalidade grave.
O princípio da tipicidade é crucial para a preservação do princípio da legalidade. A conduta infracional e sua respectiva consequência devem estar previamente descritas na norma. No entanto, na área ético-disciplinar da Medicina, a Lei 3268/57 prevê as cinco penalidades éticas, mas não especifica a que infrações cada pena se aplica. Da mesma forma, o Código de Ética vigente apenas prevê as condutas proibidas, sem determinar as penas que serão aplicadas para cada ilícito ético cometido.
Essa situação gera um flagrante insegurança jurídica e um grande desrespeito aos princípios constitucionais, afetando não apenas o acusado, mas também a sociedade. Isso pode levar a impunidade de maus profissionais devido à nulidade judicial. Portanto, uma vez aplicada qualquer sanção ético-disciplinar, independentemente do eventual cabimento do recurso, o condenado tem o direito de propor uma ação judicial pertinente para anular e/ou trancar qualquer procedimento ético-disciplinar em curso. (BARROS JUNIOR, Benedito de Almeida).
Ao proceder à análise dos dados, conforme ilustrado no infográfico, constatamos que no ano de 2023, os seguintes artigos do Código de Ética Médica foram os mais infringidos:
Essa análise sugere que, embora certos artigos do Código de Ética Médica sejam violados com mais frequência, uma ampla gama de artigos é violada, refletindo a complexidade e o alcance da prática médica. Isso reforça a importância de uma formação ética abrangente e contínua para os profissionais médicos, a fim de garantir a aderência a todas as áreas do Código de Ética Médica. Além disso, sugere que uma análise mais aprofundada das violações específicas de cada artigo pode ser útil para identificar áreas de confusão ou mal-entendido que poderiam ser alvo de educação ou esclarecimento adicional.
Para uma compreensão aprofundada das sutilezas inerentes a eventuais demandas nas quais os médicos possam se envolver, torna-se crucial o conhecimento de certos princípios que norteiam o processo ético-administrativo.
A seguir, apresento esses princípios de maneira simplificada para facilitar sua assimilação:
[1] Assis. Renato. Infográfico 2024: Judicialização da Saúde e da Medicina no Brasil. 2024
[2] Assis. Renato. Infográfico 2024: Judicialização da Saúde e da Medicina no Brasil. 2024
[3] Direito médico descomplicado [livro eletrônico] / Alex Noronha de Castro Monte, Maria Luísa Vieira Matos. — Teresina, PI : Dinâmica Jurídica, 2023.
[4] Direito médico descomplicado [livro eletrônico] / Alex Noronha de Castro Monte, Maria Luísa Vieira Matos. — Teresina, PI : Dinâmica Jurídica, 2023.