Esta questão que parece simples, em verdade possui contornos complexos. E isto porque, a natureza jurídica do contrato de plano de saúde, não extrai sua fonte dos contratos aleatórios, como aqueles fixados pelas seguradoras, mas sim, de fundamentos que emanam da Constituição da República.
Inicialmente insta salientar que tanto as Operadoras quanto as Administradoras, possuem como requisito para instalação a necessidade de inscrição nos Conselhos de Medicina, sob pena de fiscalização e imposição de multas.
E este requisito por si demonstra a relevância da atividade destas empresas, afastando-as da simples atividade de corretagem e seguro. Identificamos assim que a atividade das empresas se fundam nos pilares da sociedade brasileira, e estão apoiadas nos princípios fundamentais que organizam nossa vida em sociedade: a dignidade da pessoa humana e a inviolabilidade do direito à vida, inscritos na Magna Carta de 1988 em seus arts. 1º, inc. III e 5º, caput.
Neste sentir, bem elucida MARCIA CRISTINA CARDOSO DE BARROS, ao lecionar[1]:
Embora não tenha constado expressamente do citado dispositivo qualquer referência à proteção a saúde [Art. 5º da CRFB/88], deve-se entender que ela está embutida nas disposições de proteção ao direito à vida, posto que seria impossível conceber a ideia de garantir o bem maior- a vida- deixando de lado o bem que a assegura; ou seja, a saúde.
Diante de sua relevância, o Constituinte Originário previu um capítulo exclusivamente para tratar do tema. Trata-se do título VIII, Capítulo II, Seção II: Da Saúde, onde se identifica no art. 196 que a saúde é um direito de todos e um dever do Estado, restando claro que a prestação do serviço de saúde é um serviço público, podendo ser complementado pela iniciativa privada (art. 199).
Dada a relevância conferida pela Constituição de 1988 ao direito a saúde, a atividade da saúde suplementar, como serviço público delegado, assume contornos estratégicos e orientados no sentido da proteção da vida e do resguardo a incolumidade dos cidadãos.
Neste sentir, a natureza jurídica do contrato de plano de saúde, descrita no art. 1º da Lei 9.656/98 tem sua atividade direcionada para o atendimento do “mau futuro”, ou seja, trata-se de contrato de longa duração, voltado a utilização no momento em que o beneficiário necessitar de atenção a sua saúde.
E esta natureza de contrato/serviço de longa duração foi positivada ao art. 13 da Lei 9.656/98, que assim determina:
Art. 13. Os contratos de produtos de que tratam o inciso I e o § 1o do art. 1o desta Lei têm renovação automática a partir do vencimento do prazo inicial de vigência, não cabendo a cobrança de taxas ou qualquer outro valor no ato da renovação
Parágrafo único. Os produtos de que trata o caput, contratados individualmente, terão vigência mínima de um ano, sendo vedadas:
I – a recontagem de carências;
II – a suspensão ou a rescisão unilateral do contrato, salvo por fraude ou não-pagamento da mensalidade por período superior a sessenta dias, consecutivos ou não, nos últimos doze meses de vigência do contrato, desde que o consumidor seja comprovadamente notificado até o quinquagésimo dia de inadimplência; e
III – a suspensão ou a rescisão unilateral do contrato, em qualquer hipótese, durante a ocorrência de internação do titular
Denota-se da leitura atenta do texto da lei, combinado com o já mencionado anteriormente, que a regra é a manutenção do vínculo contratual, da persistência da relação, assegurando a prestação do atendimento à saúde por longa duração.
Asseveramos, por oportuno, que a alia decorrente dos sinistros ocorridos nos contratos de planos de saúde, pelas razões já expostas, não possuem paralelo com a alia convencional dos seguros, que são regidos pela SUSEP, fato este já descrito e caracterizado pela ANS.
[1] BARROS, Marcia Cristina Cardoso Barros. Contratos de Planos de Saúde: Princípios Básicos da Atividade. Série Aperfeiçoamento de Magistrados 6. Judicialização da Saúde – Parte 1. EMERJ, P. 290.